segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Ao encontro do Toubkal
(1) Marrakesh: a viagem para um outro mundo...

Trinta anos e uns dias depois de ter regressado de Marrocos pela terceira e última vez na vida ... antes das 5h da manhã do penúltimo dia de Agosto estava no Aeroporto da Portela, preparado para a aventura delineada desde há meses atrás.
30.08.2015, 9:00h ... Bienvenues a Marrakesh...
A equipa era de onze ... mas não, não íamos jogar à bola... J. O autor destas linhas e os seus "manos" Cristina e Zé Manel, a Dina, Miguel e André, a Anabela, a Luísa, o Arménio e o Vicente, e, claro, o Nuno, o nosso guia da Outside, todos tínhamos estado em contagem decrescente, para o início da aventura. E apesar da greve da Groundforce, a "aventura" começou apenas com 20 minutos de atraso, recuperados em voo: às 8:50h estávamos a aterrar em Marrakesh, a "cidade vermelha".
O aeroporto de Marrakesh Menara é um aeroporto como qualquer outro, mas desde logo sentimos que mudámos de Continente, que penetrámos noutro povo, noutro mundo. Não basta apresentar o passaporte, é necessário preencher uma ficha onde fica registado de onde viemos, para onde vamos, o que viemos fazer. E é necessário ... trocar euros por dirhams. 100 EUR valeram 1040 MAD; para facilitar as contas, passámos a considerar que cada nota de 100 dirhams corresponde a 10 €
Duas carrinhas esperam-nos para nos levar à cidade ... e para os primeiros passos no ventre cultural desta nação muçulmana que, nos conturbados tempos que vivemos, se vai conservando felizmente calma e acolhedora. À chegada ao "Hotel du Tresor" ... somos desde logo recebidos com o tradicional chá de menta e uns simpáticos bolinhos, à beira da piscina interior ... e onde cantámos os parabéns à aniversariante do dia... J.

Recepção, no "Hotel du Tresor" ... e parabéns à Cristina... J
.
Muito perto do bulício do Souk e da mítica Praça de Djemaa El Fna, o hotel revela-nos também o outro mundo onde estamos; alguns quartos ... parecem saídos das histórias das Mil e Uma Noites. Mas assim que arrumámos as "tralhas" ... fomo-nos embrenhar na mistura absorvente de cheiros e cores da medina, daquela praça mágica, dos sabores que a brisa por vezes nos traz, tentando suavizar o calor e a humidade crescente. Ouvem-se sons estridentes, encostamo-nos às paredes ante a passagem rápida das muitas motorizadas que circulam nas estreitas ruas do souk, tomamos um café num terraço sobre uma panóplia de cores, vamos até à Mesquita e à Torre da Koutoubia, regressamos à Djemaa El Fna. Estamos bem no coração da "cidade vermelha".

Na mítica Praça Djemaa El Fna
Torre e Mesquita da Koutoubia, em que se inspiraram a Torre Hassan de Rabat e a Giralda de Sevilha
Djemaa el Fna ...
E são horas
de almoçar...
Djemaa el Fna é a praça principal de Marraquexe. Uma cidade onde o trânsito caótico para os ocidentais é normal para estas gentes. O espectáculo é completado com danças de cobras, vendedores de água, bancadas de sumo de laranja e de água engarrafada. A Cristina faz círculos largos, afastando-se dos encantadores de serpentes. Onde estará um deles de cujos olhos, há 30 anos ... a minha menina nunca mais se esqueceu?... J

Marrakesh, Praça Djemaa el Fna ... 30 anos antes (2 de Agosto de 1985). Ainda existirás, encantador encantado?... J
Com o calor, a humidade agarra-se à pele. Recolhemos ao nosso Riad, descansamos um pouco (que o dia começou bem cedo...), refrescamo-nos na piscina interior ... e voltamos a sair. O fim do dia começa a cair como um manto. O Sol desce, num espectáculo de cores e de pratas...


O Sol desce junto à Koutoubia,
num espectáculo de cores e de pratas
Um jantar de aniversário, debruçados sobre o bulício de Djemaa el Fna
Quando o Sol se pôs ... o céu do lado contrário iluminou-se de raios ameaçadores ... e até houve uma máquina fotográfica que "explodiu"... J. As nuvens deixaram cair grossas gotas de água; era a Natureza a refrescar um pouco o ambiente abrasador ... e a limpar o prognóstico para os próximos dias. Hoje, mais logo ... vamos rumar ao Atlas, um mundo de montanhas, rios, lagos, planaltos, vales férteis e gargantas escarpadas, habitado por tribos berberes desde tempos milenares, que conservam a sua identidade pela distância e pelo isolamento. Atlas, filho de Poseidon ... foi o primeiro rei da Atlântida...

E a Super Lua sobe nos céus de Marrakesh. Hoje ... é já outro dia...
Marrakesh, 31 de Agosto, 8:00h
Ao encontro do Toubkal (1)
(Álbum completo)

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Ao encontro do Toubkal
Os preparativos...

Em Julho de 1984 estive no Veleta, o "quase" cume da Serra Nevada, onde igualmente havia subido com meus pais 15 anos antes. Com os seus 3398 metros de altitude, o Veleta manteve-se ao longo destes 31 anos como o mais alto cume onde alguma vez subi.
Estrada do Tizi-n-Test (2100m alt.), Alto Atlas, 30.07.1985
Mas, menos de quinhentos quilómetros a sudoeste das costas andaluzas, a Cordilheira do Atlas ergue-se quase mil metros acima da Serra Nevada, culminando no Jbel Toubkal, o colosso de 4167 metros de altitude que constitui o ponto mais alto de toda a África do Norte. Também em 1985 - há exactamente 30 anos - por lá andei perto, no regresso da épica "Expedição Gil Eanes". As estradas do Atlas, a travessia do mítico Tizi-n-Test, aquele outro Marrocos, a sensação de que tínhamos sido transportados para os altos planaltos do Tibete ... deixaram sempre no meu imaginário um regresso. Um regresso para um Caminho também ele mágico e místico ... ao encontro do cume, das nuvens, da montanha ... do Céu! Os berberes dizem que o cume é o ponto mais próximo de Deus a que podem chegar, ou não significasse Toubkal (جبل توبقال) ... "aquele que observa do alto".
Vale do Oued N'Fis, 30.07.1985
Do imaginário à concretização do sonho, mediou o estudo das características da "aventura" a que me propunha e da melhor data para a concretizar. A quantidade de neve no início de Julho de 2013, no Monte Perdido Extrem, aconselhou-me a optar mais pelo fim do verão. Lançado o repto a diversos companheiros de "aventuras"... logo responderam a "irmã" a que fiquei unido pelo Monte Perdido e pelo Caminho de Santiago e o "irmão" que o destino não deixou concretizar aqueles dois projectos, mas que me acompanhou na "peregrinação" da Praia de Santa Cruz a Fátima, em Abril último ... e que um dia completarei até Santiago. Este meu "irmão" ... leva a família "toda". E com mais dois candidatos e duas candidatas ao Toubkal, formamos uma bela equipa de 10 amantes da montanha e dos desafios. Como o destino traz coincidências interessantes ... 5 dos 10 elementos da equipa são do signo Virgem ... com uma aniversariante no próprio dia da partida... J. Tenho pena que os meus outros "irmãos Santiagueiros" não estejam ... não se pode estar em todo o lado; Araújo, meu Irmão e mentor ... Bom Caminho!
Quanto à logística, havia três opções: aventurarmo-nos em autogestão; recorrer aos serviços de uma empresa local, como a ligada ao Clube Alpino Francês (CAF); ou aos de uma empresa portuguesa. A proposta da portuguesa Outside entusiasmou-nos desde cedo: um guia português, desde Lisboa, um programa de oito dias, quatro deles de trekking na montanha, disponibilidade para a data por nós escolhida, simpatia, uma boa relação qualidade/preço ... levaram-nos a estar de partida! No próximo domingo, penúltimo dia de Agosto, antes das 5 h da manhã, 3 dias depois de completar 62 anos ... lá estaremos no Aeroporto da Portela ... cheios de sede de aventura...


Na bagagem vai o material indispensável para uma aventura desta natureza ... mas na minha bagagem vão também três objectos que me têm passado a acompanhar, a proteger e a dar-me força em todas as minhas caminhadas e "aventuras":
  • a pedrinha que a minha irmãzinha mais nova me deu no Cabo Fisterra, no fim do Camiño;
  • o trevo de quatro folhas que uma outra irmã me deu, na sequência do trágico mês de Fevereiro deste ano e da catarse de um fim de semana de Março no Gerês;
  • e ... uma imagem de Nossa Senhora de Fátima, que me foi dada pela minha Mãe há muitos anos, com o intuito de precisamente me acompanhar nas minhas aventuras por fragas e pragas. Curiosamente ... Fátima é nome árabe...
Lá, no cume do Toubkal ... será também o ponto mais próximo a que posso chegar da minha Mãe, do meu sogro, do meu Tio Carlos...! Quanto à minha companheira de vida e de tantas e tantas "aventuras", esta não é de todo uma "aventura" ao seu alcance; se pudesse ... levava-a também na bagagem... J

sábado, 22 de agosto de 2015

Em terras de Quadrazais

Em terras de Riba-Côa, entre o Sabugal e Vale de Espinho, Quadrazais ficou para a história como terra de contrabando, talvez mais do que qualquer outra freguesia do Concelho, um pouco pela mão de Nuno de Montemor e do seu "Romance de Maria Mim", mas também por efeito da gíria quadrazenha, uma linguagem específica usada e desenvolvida por uma população ao longo de décadas, de acordo com as necessidades da vida no contrabando.
Quadrazais, 22.08.2015, 8:35h - Juntam-se os caminheiros...

"Amatriz meia choina maquinamos tótios reta Francha. De galhal leva cada cinquenta chulos, artife, chaira, fugantes e baril chingato para andante."

Percebeu o leitor não quadrazenho alguma coisa? Pois, antes de ter conhecido Quadrazais e lido a "Maria Mim" e outras histórias quadrazenhas, eu também não. Mas aí está a tradução:
"Amanhã à meia noite partimos todos para Espanha. Cada um leva cinquenta duros, pão, carne, pistolas e bom vinho para a viagem."
Ora, o Lar de Santa Eufémia, em Quadrazais, organizou para este sábado de Agosto uma caminhada "pelo envelhecimento activo". Caminhada circular, da parte da manhã, entre a sede da freguesia e a povoação anexa de Ozendo, estando nós em Vale de Espinho ... era "obrigatório" participarmos nesta iniciativa... J. E assim lá estávamos, antes das nove da manhã, preparados para maquinarmos tótios...

Há caminheiros de todas as idades!
Alto de S. Gens (950m alt.)
Descida do alto de S. Gens para Ozendo
Entrada em Ozendo
Organizada, como disse, pelo Lar de Santa Eufémia, em colaboração com a Associação Recreativa e Cultural do Ozendo, esta caminhada teve o privilégio de contar com participantes de todas as idades, incluindo alguns dos utentes do Lar, proporcionando um verdadeiro "envelhecimento activo". Os menos possibilitados fisicamente percorreram apenas os primeiros metros, sendo depois transportados pela carrinha do Lar para a sede da ARCO, onde houve um pequeno reforço alimentar e um bonito momento de convívio, que incluiu um louvor cantado a Nª Srª de Fátima.

Ozendo: imagens de outros tempos
Reforço alimentar e convívio, na
Associação Recreativa e Cultural do Ozendo
E maquinamos de novo, pelos velhos caminhos do Ozendo, rumo a Quadrazais
Antes do meio luzio (meio dia) e com menos de 9 quilómetros percorridos, estávamos de novo às portas de Quadrazais. Mas ainda descemos ao Lameirão do Côa, por entre frondoso carvalhal, antes de regressar a cosque (casa), ou seja ... ao Lar de Santa Eufémia.

À entrada de Quadrazais: já há ouriços
A caminho do Côa
O Côa, no Lameirão
Bela perspectiva de Quadrazais, no regresso do Côa
E regressamos às ruas onde, pela pena de Nuno de Montemor, terá deambulado Maria Mim
Bem à hora de assuquir (comer), com 11 km de andante (caminho), estávamos de regresso ao Lar. E o almoço ... foi um excelente exemplo de comunhão e convívio, em que participaram todos os utentes do Lar que se puderam deslocar do seu quarto para uma improvisada "esplanada", onde as mesas foram montadas com as antigas portas interiores do edifício, entretanto renovadas. Foi-me proporcionado conhecer as instalações do Lar de Santa Eufémia ... e o que vi foi uma excelente unidade de apoio à terceira idade, onde muitos utentes seguramente ainda vêem, no seu imaginário e nos seus sonhos, as antigas imagens de luta pela vida, nas bredas do contrabando.

Lar de Santa Eufémia: estava terminada a caminhada ... e seguiu-se um merecido almoço de confraternização
Depois do almoço, ainda houve lugar a um belo momento musical. Quadrazenhas de gema cantaram "A Quadrazenha", um verdadeiro hino a Quadrazais ... e o sempre virtuoso Malcatenho José Corceiro Lucas tocou e encantou para quem quis cantar ... porque "Se alguém houver que não queira ... Trá-lo contigo também ..."!

                      "Quadrazenha,
                       Tão linda, tão sedutora,
                       Pareces a Virgem Senhora! ...."
"Seja bem vindo quem vier por bem ...."
 
(Clique nas fotos para ver o vídeo)
Nas últimas horas de caminhada e principalmente no pós-almoço, este belo dia foi contudo ensombrado pela visão de grossas nuvens de fumo negro e pelo voo dos aviões de combate a incêndios. O concelho do Sabugal estava dolorosamente em chamas! Desta vez aparentemente por causas naturais, um raio terá originado um cenário dantesco, que se estendeu da Serra da Pena e das velhas ruínas das Aguas Radium até muito próximo de Águas Belas, ameaçando diversas povoações e roubando uma vida, que tentava salvar os seus animais de uma morte que acabou por lhe bater inesperadamente à porta. Semanas antes, tinha assistido bem perto à tragédia da Serra da Gata e do "meu" Xalmas. Agora, na "minha" Vale de Espinho, cheguei a ter o carro coberto de cinzas, trazidas pelos ventos das terras mártires do poente transcudano. Que Xalmas (deus Vetão das águas) traga rapidamente as chuvas que se parecem adivinhar no ar pesado, até porque chegou ao fim esta minha e nossa estadia estival nas nossas terras de Riba-Côa. Falta pouco para maquinarmos rumo a Mata Granja (Lisboa, na gíria quadrazenha) ... e falta pouco para novas "aventuras"... J.
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quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Rota dos Contrabandistas
Vale de Espinho - Navasfrias

Organizada pela ADAVE - Associação dos Amigos de Vale de Espinho - realizou-se hoje uma caminhada evocativa das antigas rotas do contrabando, entre Vale de Espinho e Navasfrias.
Por percurso todo ele já meu velho conhecido, mas claro que tínhamos de acompanhar esta iniciativa, tanto mais que nos anos anteriores não se proporcionou estarmos nas anteriores versões da mesma. Não havia verdadeiros "carregos", nem guardas fiscais e carabineiros ... mas havia cerca de 200 naturais e amigos desta "minha" aldeia raiana.
A partida foi da sede da Associação às 7 horas, para apanharmos o fresco matinal. Pelos Nheres, Cortes e Balsas rumámos ao alto da Matança ... não sem antes um bom pequeno almoço ao cruzar a estrada Fóios - Soito. Ao fundo já se via o "meu" Xalmas; deixámos os Fóios à direita, cruzámos a estrada de Aldeia do Bispo na Rodeira ... e entrámos em terras de nuestros hermanos.
E se até ali o percurso tinha sido maioritariamente a subir, embora suavemente, da raia descemos ao Valdelagarto e entrámos nos frescos e sombrosos carvalhais até à salmantina Navasfrias. Num grupo tão grande claro que havia grande heterogeneidade; os mais apressados ... chegaram com quase uma hora de avanço em relação aos últimos!

Indicações preliminares ... e começa a
marcha (Vale de Espinho, 12.08.2015, 7:00h)
Cruzando a estrada Fóios - Soito ... com o Xalmas ao fundo
E chegamos à estrada Fóios - Aldeia do Bispo
Já em Espanha ... o Xalmas continua a vigiar-nos
Catedrais verdes ...
E estamos em Navasfrias, a cruzar o Águeda, irmão gémeo do Côa
O destino final era o parque do Bardal, onde já levei os "meus" Caminheiros Gaspar Correia, quando em Fevereiro de 2009 os fiz atravessar o Xalmas nevado. Agora, a organização desta caminhada nas rotas do contrabando tinha preparado ali um completo e revigorante almoço, com o qual o convívio terminou, regressando-se a Vale de Espinho em autocarros da "velha" Viúva Monteiro.
Parque do Bardal, Navasfrias ... onde o "contrabando" terminou ...
Parabéns à ADAVE ... e venham mais organizações e actividades desta natureza.
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