quarta-feira, 16 de julho de 2014

O Caminho de Santiago ... pelo Caminho da Aventura!

De Braga a Santiago de Compostela ... e às terras do fim do mundo!

Três dias antes de partir de Braga, publiquei a história da preparação do nosso Caminho de Santiago, meu e da equipa que desde sempre se juntou ao meu projecto. Era, como então disse, un Camiño por descobrir, já que muito poucas informações havia sobre os Caminhos históricos que ligavam Bracara Augusta a Santiago, pelo "meu" amado Gerês (atravessando a Geira romana, ou Via Nova) e por velhas rotas medievais utilizadas por peregrinos que, do norte de Portugal e do sul da Galiza, se dirigiam à cidade do Apóstolo, por vezes na esperança de uma cura milagrosa para a lepra.
Milha XV da Geira Romana, em terras de Terras de Bouro
5.07.2014, 13h10 (1º dia)
Agora, de regresso ao ninho, posso dizer que vivi, fora do âmbito da família que felizmente e orgulhosamente construí, aquela que foi sem dúvida a experiência e a vivência mais fascinante da minha vida! Obrigado meus amigos, que partilharam comigo esta aventura, que partilharam comigo emoções, vivências intensas e inesquecíveis. Obrigado ... meus irmãos!
É impossível descrever o que foi este Caminho, o que foram estes 12 dias, seja por palavras, fotos (há mais de mil...) ou vídeo. Este meu post nestas minhas "memórias" ... é portanto muito mais curto do que eu próprio esperava que viesse a ser.

No "meu" Gerês: Barragem de Vilarinho da Furna, 6.07.2014, 14h30 (2º dia)
Não há descrição possível para o turbilhão de emoções sentidas e partilhadas. Não há descrição possível para a força interior que sai de cada um de nós, nos momentos de fraqueza, na entreajuda, na comoção, nas emoções. Seja-se o que se seja do ponto de vista espiritual, gnóstico, religioso, ou o que se lhe queira chamar ... o Caminho mexe com cada um de nós. Quem volta não é o mesmo que quem parte.

De Castro Laboreiro ao Porto dos Cavaleiros, 8.07.2014, 08h00 ... nem tudo são rosas... (4º dia)
Com o Alcalde de Cortegada, 8.07.2014, 20h20 (4º dia)
Terras do Ribeiro... - 9.07.2014, 12h40 (5º dia)
Ribadavia, 9.07.2014, 13h40 (5º dia)
Por paraísos perdidos ... Outeiro de Lebosende, 10.07.2014, 8h45 (6º dia)
Quando construímos um "monolito" nos Montes de Testeiro ... 11.07.2014, 11h30 (7º dia)
Caminho de Aventura...
12.07.2014, 15h20 - À vista do Pico Sacro! (8º dia)
Sendo um Caminho de descoberta de velhas rotas medievais, este foi também um Caminho de Descoberta de nós próprios ... mas também um verdadeiro Caminho de Aventura ... como sabíamos que iria ser. Quantas vezes nos "perdemos" por entre fetos e silvas, desbravando matos, voltando atrás, abrindo novos rumos?
Mas, na tarde do 8º dia ... avistámos o "farol" que nos passou a guiar: o lendário Pico Sacro, recheado de lendas, de que sobressai a história de Santiago e da Rainha Lupa. Em Ponte Ulla entrámos no Camiño Sanabrés ... mas incluímos na nossa "aventura" o cume do Pico Sacro!

Cume do Pico Sacro ... frente a Santiago de Compostela, 13.07.2014, 9h50 (9º dia)
Ao abraçar o geodésico do Sacro ...
abraço a vida!
Plaza do Obradoiro, Santiago de Compostela, 13.07.2014, 16h10 (9º dia)
Para aqui convergem todos os Caminhos ... todos os destinos ... todas as emoções...
Chegados a Compostela ao 9º dia, com 260km percorridos desde Braga ... tínhamos terminado o Caminho? Não! O Caminho não acaba em Santiago ... o Caminho acaba nas terras do fim do mundo...!
Particularmente para um dos membros da nossa "irmandade", o objectivo supremo era Fisterra, o finis terrae, considerado antes de Colombo o ponto extremo do mundo conhecido na Espanha de então.
Não tendo parte do grupo disponibilidade para mais dias, aquele nosso Irmão optou pela admirável solução de compromisso que permitia manter a união dos quatro. E assim, ao 10º dia, fomos portanto de Santiago a Dumbría, onde iniciámos a última jornada ... até ao fim do mundo!

A caminho do Fim do Mundo, 14.07.2014, 13h15 (10º dia)
14.07, 21h30 - Uma irmandade unida pela energia cósmica...
Quase 40 longos quilómetros levaram-nos de Dumbría à ponta do Cabo Fisterra ... e o que ali vivemos foi uma autêntica catarse purificadora, antes e durante o espectáculo grandioso do pôr-do-Sol no mar!

No lugar onde o fim se torna início...
Ficam para já apenas estas fotos, poucas, muito poucas. A seu tempo aparecerá o vídeo, que procurará transmitir o que foi o nosso Caminho ... da Aventura.


Um agradecimento justo e final à Câmara Municipal de Terras de Bouro, na pessoa do seu vereador António Cunha, que nos alojou nas instalações da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Terras de Bouro, bem como ao Concello de Cortegada, na pessoa do respectivo Alcalde, Avelino Luis de Francisco Martínez, que nos recebeu pessoalmente e nos ofereceu as refeições e o alojamento no Pavilhão Municipal daquela bonita vila termal, e ainda ao Concello de Forcarei, que igualmente nos instalou no Pavilhão Municipal de Soutelo de Montes.
Merece também um especial agradecimento o casal de proprietários da Casa Rural Brués. No Caminho da Aventura, onde não existem Albergues de Peregrinos, quando estávamos francamente a necessitar de uma tarde de descanso e de reposição de energias ... a Casa Brués caiu-nos autenticamente do céu, tanto pelo encanto do lugar como pela facilidade, gentileza e simpatia concedidas, autorizando-nos a instalação como quiséssemos, onde quiséssemos.
Bem hajam!
Obrigado finalmente ... às botas que me levaram a palmilhar sensivelmente 300 km, de Braga a Santiago e às terras do fim do mundo. As botas cá estão de novo, subindo a escada do ninho ... subindo a escada da Vida, do Amor, da Felicidade, da Amizade!. As emoções, as vivências, a partilha ... essas são indescritíveis e permanecerão para todo o sempre nas nossas memórias!



quarta-feira, 2 de julho de 2014

A caminho ... do Caminho de Santiago

Neste meu blog, em que um dia resolvi começar a deixar as minhas memórias, é a primeira vez que escrevo sobre uma "aventura" ... antes da "aventura". E porquê? Porque a "aventura" que vou começar a viver dentro de poucos dias é diferente de todas as outras "aventuras" vividas...! Desta vez estou prestes a fazer-me ao caminho ... mas a um Caminho especial. Estou a caminho ... do Caminho de Santiago.
"Os peregrinos que fixeron o Camiño de Santiago, dende o século IX en diante, tiveron diversas motivacións, fundamentalmente relixiosas, nun primeiro momento, e doutros tipos ó longo dos séculos." (Wikipedia)
A minha motivação para o Caminho de Santiago? Ir!... Aliar o misticismo do Caminho à minha paixão pelos grandes espaços...
Aos 60 anos, depois de mais de 40 anos por fragas e pragas ... depois de "aventuras" as mais diversas, nos mais diversos paraísos perdidos da Ibéria, depois de ter percorrido os Caminhos de Fátima ... eis-me a preparar O Caminho ... o meu Caminho ... o nosso Caminho ... nos Caminhos de Santiago!

"É un camiño moi antigo que te leva a novas experiencias. Sexan cales foren as túas crenzas, o Camiño é unha experiencia única que vas vivir en corpo e alma. Unha viaxe espiritual que te leva ao encontro coa natureza, cos outros e, sobre todo, contigo mesmo." (Camiño de Santiago)

Caminho da Geira Romana
Normalmente, associa-se o Caminho Português ao percurso por Santarém, Porto, Valença, ou também ao chamado Caminho do Interior, por Viseu, Lamego, Chaves. Mas houve, historicamente, outras vias de peregrinação, como o Caminho de Torres (proveniente de Salamanca, pela Guarda, Sernancelhe e Lamego), ou as diversas vias que atravessavam o Alto Minho.
Uma dessas vias ... é o Caminho da Geira Romana, que atravessa o Parque Nacional da Peneda-Gerês pela Portela do Homem e, de novo, pelo Planalto Castrejo. Diversos factores contribuíram para a escolha deste percurso. O Caminho Francês, os caminhos portugueses desde Lisboa, ou mesmo a partir da "minha" Vale de Espinho (pela Guarda e Lamego), implicariam sempre uma "aventura" de várias semanas a mais de um mês. Não se achando a minha "pequena arraiana" com forças para se fazer ao Caminho ... era muito tempo! E a hipótese de fazer meia dúzia de etapas separadas não me seduzia. Um dia, ela própria me disse: "se queres tanto fazer, porque é que não fazes a partir do Porto?".
Essa pista acendeu-me a luz: quem começa no Porto também pode começar em Braga, que na Idade Média disputava com Compostela o título de centro da Cristandade na Península. Depois, a minha paixão pelo Gerês claro que também pesava; atravessar o Gerês a pé, a caminho de Santiago ... era uma aliciante!
E assim começou a Etapa -1... J. Foi a etapa de reunir elementos, estudar percursos. Sendo uma das vias menos massificada dos Caminhos de Santiago ... é também a menos assinalada, a menos documentada ... sem Albergues. Mas a pesquisa foi começando a dar os seus frutos...
Para o percurso em Portugal, uma das melhores fontes que encontrei foram as "Rotas do Alto Minho", uma publicação da Região de Turismo do Alto Minho.
Partindo de Braga, os peregrinos passavam por São Frutuoso de Montélios, atravessavam o Rio Cávado em direcção a Terras de Bouro e depois seguiam para o Gerês, entrando em terras de Espanha pela Portela do Homem. A partir de Vilarinho da Furna, o percurso é o da mata da Bouça da Mó, da "minha" velha Geira e dos "meus" velhos marcos miliários romanos, tantas vezes mostrados a grupos de alunos, nos bons velhos tempos das excursões ao Gerês.

Camiño Miñoto-Ribeiro
E na Galiza? Já tinha reunido informações acerca da passagem desta velha via de Santiago pelas terras de Lobios e de Entrimo, antes de voltar a território português, para atravessar o planalto de Castro Laboreiro, rumo a terras de Melgaço. Mas ... e depois, em terras galegas?
Depois ... soube da existência de pelo menos duas rotas medievais utilizadas pelos peregrinos que, do norte de Portugal e do sul da Galiza, se dirigiam à cidade do Apóstolo. Essas rotas estavam ligadas não só à religião mas também ao comércio, como é o caso do Camiño Vreeiro, utilizado pelos arrieiros que levavam o vinho Ribeiro até Compostela. O outro, era o Camiño Miñoto-Ribeiro, seguido principalmente por leprosos em peregrinação a Santiago, na esperança de uma cura milagrosa.
Diversos vestígios de hospitais e leprosarias testemunham esta vertente do Caminho, ligada à história da Saúde Pública. Actualmente, a área de Medicina Preventiva e Saúde Pública do campus de Pontevedra e as Associações Camiño Xacobeo Miñoto-Ribeiro e Eirasenda estão a implementar a recuperação deste velho Caminho que, desde o concelho de Padrenda (limítrofe com o nosso de Melgaço), seguia por Cortegada, cruzava o Rio Minho entre Arnoia e Ribadavia e continuava por terras de Forcarei e A Estrada ... rumo a Santiago.
Infelizmente, a referida Associação Camiño Xacobeo Miñoto-Ribeiro mostrou-se bastante fechada e pouco cordial, pelo que o estudo do percurso mais viável prosseguiu com base na pesquisa de informações históricas e geográficas, na rede, bem como no estudo das cartas topográficas do Centro Nacional de Información Geográfica (CNIG).
Não havendo Albergues na maior parte do trajecto, houve que recorrer à colaboração das autarquias. Desde a primeira hora, os municípios de Terras de Bouro, Cortegada e Forcarei disponibilizaram-se para receber os "peregrinos"; para aqueles municípios, o meu muito obrigado. E assim, gradualmente, o "meu" Caminho foi passando da Etapa -1 à Etapa 0. Foi, verdadeiramente, desencantar


A etapa 0 ... é a etapa da preparação da mochila... J. O Caminho vai ser feito ... ao ritmo do tempo e dos tempos. No dia em que faz um ano que comecei a grande "aventura" do Monte Perdido Extrem, quase com a mesma equipa que comigo viveu aqueles 4 fantásticos dias ...

O próximo sábado 5 de xullo imos facernos ao CamiñoBo camiño, compañeiro(a)s!

Luar Na Lubre - "Romance de Don Gaiferos", tema especial gravado para o álbum "Cantigas do Camiño"