sábado, 25 de maio de 2013

"Romagem" de saudade às terras do Vale da Maria e da Fonte Moira

"O meu Avô Madaleno e os filhos mais velhos receberam o terreno do Vale da Maria e ali plantaram castanheiros, vinha, árvores de fruto. Ali tiveram trabalhos e sonhos. Algo de mágico se mantém, como que um eco do sonho que fez correr o meu Avô, há mais de cem anos. Faz parte das memórias de família e está preso no coração."
(Aurora Martins Madaleno)
Quando em Janeiro subi mais uma vez as ladeiras do Vale da Maria e da Barroca da Fonte Moira, nas "minhas" terras de Vale de Espinho, despertei a nostalgia de quem viveu os tempos em que estas terras tinham vida, gente, trabalho, suor ... mas estava muito longe de vir a ser "convocado" para orientar uma jornada de recordação e saudade!
Na velha Escola de Vale de Espinho ... vai começar uma
caminhada nostálgica!  25.05.2013, 9:30h
Por iniciativa de dois filhos "biológicos” de Vale de Espinho, realizou-se hoje uma caminhada de saudade às terras do Vale da Maria e da Fonte Moira. A actividade contou com a participação de mais de 30 naturais e amigos de Vale de Espinho, entre os quais se destacou a presença de quem há mais de 50 anos não percorria campos e lameiros que lhe foram familiares; são dela as nostálgicas palavras acima transcritas.
Como amigo de Vale de Espinho e das terras raianas … os organizadores desta iniciativa escolheram-me para delinear o percurso desta "romagem" de saudade. Quanta honra! Quanto prazer ao guiar assim um grupo de naturais destas terras, que tenho percorrido ao longo dos últimos 40 anos e que, por casamento, adoptei como minhas!

Campos e lameiros da Ribeira do Vale da Maria 
Pouco depois das 9 e meia da manhã estávamos assim a sair da velha escola, rumo ao Pontão do Pisão, ao Côa … à Ribeira do Vale da Maria. Sucederam-se paisagens, sensações, emoções, intervaladas aqui e ali por histórias contadas por quem as viveu ou as ouviu contar, histórias de vidas, de lutas, de suores, de felicidades e tristezas. A merenda foi nos lameiros onde correm já as águas da Barroca da Fonte Moira … e ali se leram também belas quadras, quadras que respiram e transpiram a saudade e a nostalgia de um passado que se distanciou nas nuvens do tempo. Ao som das águas que correm vale abaixo, também se cantaram canções populares, também se brincou e conviveu, numa amena convivência entre "irmãos" que, nalguns casos, igualmente há muito não se encontravam. A derradeira ladeira para o Cabeço Passil custou a subir; a vereda era estreita e pedregosa … a lembrar as velhas "bredas" do contrabando, com os "carregos" às costas. Mas chegados ao cimo … a panorâmica valeu o esforço: ao fundo, a nascente, a Serra das Mesas, berço do Côa. Aos nossos pés, Vale de Espinho, a aldeia que, de um modo ou de outro, é a aldeia de todos os que participaram nesta "romagem". Os Foios e Quadrazais assomavam-se a ladear a "nossa" aldeia, com a Serra do Homem de Pedra por trás dela. Que paisagem sublime!

Na hora da merenda
Recomeça a marcha ... na parte empinada...
E Vale de Espinho à vista!
O regresso foi pelo Cabeço Alto, rumo ao Cabeço da Ponte. Agora tínhamos o Vale da Maria à nossa esquerda, os verdes lameiros aos nossos pés. E a entrada em Vale de Espinho foi, como não podia deixar de ser, pela velha Ponte romana, que já viu passar tantas águas e tantas gerações.

E chegamos à velha Ponte romana
O grupo dos naturais e amigos de Vale de Espinho na Ponte romana do Côa
Entramos em Vale de Espinho quando batem
as 4 da tarde, com 11 belos km percorridos!
Os organizadores desta feliz iniciativa estão sem dúvida de parabéns! Os "heróicos" participantes também. Não foi uma caminhada longa, fizeram-se uns simples 11 km, mas foi uma longa caminhada no tempo, um recuo ao passado que não está perdido nas memórias dos Valespinhenses! E, como também não podia deixar de ser, o dia terminou com um convívio entre todos os participantes.

E já a vermos as fotografias do dia ...
... até que chegou a hora do adeus!
Bem hajam os organizadores desta iniciativa, que se deve repetir. Bem hajam todos os naturais e amigos de Vale de Espinho. Viva Vale de Espinho!
Ver o álbum completo

domingo, 19 de maio de 2013

GRD Gerês / Xurés ...
Da Misarela à aldeia velha de Juriz ... passando pelos Carris e Sombras

Quando em Janeiro de 2012 caminhei pela primeira vez com um grupo de adeptos dos percursos longos e de alguma dureza - as GRDs (grandes rotas duras) - logo soube que havia de viver com eles mais "aventuras". Por isso os acompanhei nas Serras de Aire e Candeeiros, na Arrábida, ainda há pouco nos campos de Oledo e da Idanha ... por isso os levei já às terras do Côa, à Malcata, à Serra da Gata.
17.05.2013, 9:25h - Perto da Barragem da Venda Nova...
a caminho das terras mágicas do Gerês ... com arco-íris
Num grupo onde impera a amizade e a disponibilidade, onde a sensibilidade desperta a cada curva do caminho, onde no canto de cada sonho nascem vontades ... há muito que uma travessia do Gerês estava no imaginário destes amigos das GRDs. Os dados estavam lançados para um novo desafio...
A partir de Vale de Espinho, onde mais uma vez me encontrava em "retiro", na sexta feira fui-me encontrar com parte do grupo na mítica Ponte da Misarela, lá onde o Barroso confina com o Minho, onde o Rabagão é transposto pela ponte que o diabo não queria deixar erguer, lá onde se baptizavam as crianças ainda no ventre materno.
Ao percorrermos a velha ponte e as muitas fragas que a ladeiam, ao som das águas agitadas do Rabagão, quase nos parecia ver surgir o mafarrico e a sua voz tonitruante: "Salvo-te, pois claro ... mas se me deres a alma em troca". Nós ... salvámo-nos com um bom almoço em Sidrós, a aldeia barrosã unida à minhota aldeia de Frades pela Ponte da Misarela... J. E ao fim do dia reuniamo-nos ao resto do grupo em Pitões das Júnias ... a "aldeia mágica".

Ponte da Misarela, lá onde o Rabagão separa terras minhotas das terras do Barroso
Em Pitões das Júnias ... claro que nos esperavam as minhas velhas amigas da "Casa do Preto"  Quantas vezes já ali fiquei? Quantas vezes as abracei? Quantas vezes me emocionei com o carinho com que ali sou recebido? Obrigado Srª Maria (mãe e filha), Tina, Sandra ... obrigado a todas e todos os que ali me têm recebido ao longo de mais de 30 anos! Eu sinto-me um pouco de Pitões das Júnias...

Pitões das Júnias ... a aldeia mágica. O panorama meteorológico não era dos melhores...
Sábado era o dia da grande rota! A ideia era a grande travessia Pitões - Fonte Fria - Carris, descendo depois a vertente galega para as Sombras e para os banhos quentes de Rio Caldo. A meteorologia tinha-nos metido medo durante quase toda a semana ... mas não esperávamos por neve!
Os planos alternativos eram vários ... mas o meu já proverbial e habitual "pacto" com S. Pedro vingou... J. Juntamente com a alegria e o companheirismo de todos, vivemos assim um fabuloso fim de semana, de paisagens, sensações e emoções inesquecíveis.

18.05.2013, 6:15h - A "grande marcha" tinha começado: Pitões - S. João da Fraga - Carris - Sombras - Rio Caldo
Carvalhal do Beredo
Subida à mítica Ermida do S. João da Fraga
Acabámos por cortar apenas a subida à Nevosa, ponto mais alto do Gerês e de todo o norte. Dadas as condições de chuva e nevoeiro, em que nada veríamos nas alturas da Fonte Fria à Nevosa, optámos pelo percurso de meia encosta, pelo S. João da Fraga, Cornos de Candela e Lamalonga.

O S. João da Fraga ia ficando para trás...
Ribeiro Teixeira
E a longa marcha prossegue,
rumo à Lamalonga
Ribeiro da Biduiça
Vale da Biduiça
E passada a Ribeira das Negras, chegamos à Lamalonga
Ao longo do percurso tivemos de tudo: Sol, muitas nuvens, chuva (pouca), vento, granizo ... e neve! Mas nada que impedisse a marcha. À hora do almoço estávamos na Lamalonga, na base da vertiginosa subida para os Carris ... que foi feita debaixo de uma mistura de granizo e neve! E que espectáculo se nos iria deparar lá no alto, com as ruínas do complexo mineiro completamente "perdidas" na neve e no nevoeiro que por vezes teimava em envolver-nos, a nós e àquelas paragens onde se sente a força da natureza e da história!
Subida para os Carris ... debaixo de neve!
No "reino perdido" dos Carris (1450m alt.), 18.05.2013, 14:50h
Com cerca de 16 km percorridos, deixámos os Carris pelo velho estradão mineiro, até um pouco antes da Ponte das Abrótegas, inflectindo então para norte, para o vale da Amoreira. O objectivo eram agora as Minas das Sombras ... e os tão desejados e esperados banhos quentes no Rio Caldo! Mas ainda faltava quase outro tanto...

Pico do Sobreiro, perdido nas nuvens e na neve
Descendo o vale da Amoreira, rumo ...
... à fronteira entre terras lusas e galegas, entre o Gerês e o Xurés
E entramos no fabuloso Vale das Sombras
A descida para a vertente galega esteve contudo sempre interrogada até a iniciarmos, já que as previsões meteorológicas eram bem piores do que para o lado luso; a alternativa seria descer pela Sesta da Lamalonga ou pelo Castanheiro, direito a Lapela. Mas mais uma vez ... tivemos o S. Pedro do nosso lado! Ao fundo via-se Sol e algumas aldeias galegas. O vento empurrou as nuvens negras para sul, largaram alguns ligeiros borrifos de chuva e granizo ... e vieram sucessivas abertas de bom Sol, permitindo admirar o fabuloso vale das Sombras (o vale do Rio de Vilameá), com as suas espectaculares cores, as sucessivas cascatas e piscinas naturais ... o autêntico Shangri-La que eu um dia "descobri", em caminhada solitária, em Outubro de 2010. Descendo o vale, à nossa direita tínhamos o paredão rochoso do Pión de Paredes ... que naquele mesmo dia 20 de Outubro de 2010 trepei a bom trepar, para as alturas do galego Altar dos Cabrós e do fronteiriço Pico do Sobreiro... J.
Minas das Sombras, 18.05.2013
Altar dos Cabrós (Altar de Cabrões), 20.10.2010
Descendo o fabuloso Vale das Sombras, ou do Rio de Vilameá, 18.05.2013
Ponte de Porta Paredes, sobre o rio de Vilameá
Já a 700 metros de altitude, a ponte de madeira de Porta Paredes atravessou-nos para a margem esquerda do rio de Vilameá ... e pouco depois mudámos de vale: um pouco acima da Ermida de Nosa Señora do Xurés seguimos o Sol poente e descemos para o vale do Rio Caldo e para Torneiros ... rumo às tão desejadas águas caldas do Rio Caldo!

Já à vista do vale do Rio Caldo ...
... e da aldeia de Torneiros
Passavam 20 minutos das 19 horas portuguesas quanto "aterrámos" naquelas maravilhosas águas.
Nos banhos quentes do Rio Caldo ... onde todo o cansaço e
todos os "males" se desvaneceram... J! (Foto: Cristina Ribeiro)
Com exactamente 30 km nos pés, um desnível acumulado de 1800 metros de subida e 2500 de descida ... os cerca de 40ºC a que a água deveria estar foram uma cura milagrosa para todos os "males" de que nos pudéssemos eventualmente queixar!
Foram sensivelmente 13 horas de uma fabulosa travessia, bem dura, é certo, que eu já conhecia ... mas que não me cansei nem cansarei de repetir ... na companhia de tão bons e heróicos caminheiros e amigos!
O mini-bus da "Casa dos Braganças", de Tourém, levou-nos de regresso a Pitões ... onde nos esperava a afamada e deliciosa posta barrosã da "Casa do Preto" ... para repôr as energias gastas durante a espectacular caminhada que tínhamos acabado de viver.


Mas ainda havia domingo. Pequena ... mas ainda havia caminhada! E caminhada a três dos locais mais emblemáticos de Pitões das Júnias: o vetusto Mosteiro de Santa Maria das Júnias, a Cascata de Pitões ... e a aldeia velha de Juriz, que eu "descobri" há menos de um ano.

O vetusto Mosteiro de Santa Maria das Júnias, dos sec.s XIII e XIV, ligado à Ordem de Cister (19.05.2013)
Junto ao Mosteiro de Pitões ... procedemos 
à plantação de pequenos carvalhos
E do Mosteiro seguimos para a Cascata de Pitões
No Miradouro da Cascata de
Pitões  (Fotos: Carlos Mota e Lena Casal)
A caminho da aldeia velha de Juriz  (Foto: Carlos Mota)
No local da aldeia medieval de Sancti Vincencii de Juriz, referida já nas Inquirições Afonsinas, parece ter havido um castro celta, onde o denso carvalhal camufla e protege os toscos vestígios do povoado, onde se ouvem nas sombras as especulações sobre o seu abandono no século XV, talvez devido à peste, talvez devido a uma praga de formigas … talvez ... talvez!

Na senda da aldeia velha de Juriz, 19.05.2013
E de repente, por entre a ramagem, surge a cruz da velha "igreja" do Juriz...
Na "igreja" do Juriz ...
magia em estado puro...
Mais uma plantação
de carvalhos!
E o adeus a Pitões das Júnias e às terras mágicas do Gerês.  Mas não é um adeus ... é só um até breve...
A aldeia velha de Juriz marcou o fim deste fabuloso fim de semana, em que vivemos a magia do Gerês ... mas em que vivemos também a magia de uma camaradagem e de uma alegria de viver estampada nos rostos de todos quantos o viveram. Vivemos Amizade, vivemos Natureza, vivemos Aventura ... ou não fosse "A dose certa de aventura o ingrediente que nos permite provar o sabor, por vezes escondido, que a vida nos reserva em jeito de pura liberdade..." (Luís Vendeirinho)
"Poderia eu dizer que é bom caminhar pela mais bela das montanhas ... poderia eu fazer um grandioso hino à amizade ... poderia divulgar a mais linda poesia ... mas basta dizer simplesmente que foi alegria tamanha ... de momentos de solidariedade ... de dias que se resumem, no tempo e na vida, como um "grande dia" ... e de prendas para a natureza que nos acolhe docemente."
Obrigado, amigos! Viveremos seguramente novas "aventuras" ... em jeito de pura liberdade!